domingo, 23 de dezembro de 2007


... Mas é que eu sou uma menina de olhos vivos e coração aflito.
É que eu sou uma menina quase velha de tanta esperança...
É que sou também irreprimível, incontrolável, deslumbrada fugitiva da própria consciência.

Incontestavelmente, um caso perdido.

Mas posso ser compreendida. Um só olhar me abrange inteira.
O que eu não posso - e isso até já tentei - é ser desvendada.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Sábio Animal




É claro que sou um pouco imoral
Não declaro respeito e nem sequer
Sei se os termos banais em minha vida
Dizem o que realmente se quer.
Sabemos, porém, que o absurdo é um tanto normal
Como também as despedidas e beijos
E o retorno ao pálido desejo
Em espantos de amor
Rebeldia
E medo.
Mas,
Ao trazer
E repetir a esmo
O cálido e prático respeito
É que são reveladas as deixas
De um mágico, místico e sábio Animal.
É claro que naquele instante
Tudo que é trágico se desfaz
Nasce o prazer, a honra, a paz
E viver é absolutamente normal.


*Para meu querido amigo, companheiro constante de sonecas e divagações no colegial, e grande poeta, Thales de Sousa.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Sobre a Saudade



A saudade é doída... É doida...
Essa saudade é um escândalo, um estrondo dentro de mim.
É um papôco na cabeça que me deixa tonta e me dificulta até respirar, de vez em quando.
Um abuso uma saudade dessas. Mil coisas pra fazer, e ela me impedindo até de pensar.
Se pelo menos teu cheiro sumisse da minha pele, se a tua voz abandonasse a mania de ecoar nos meus ouvidos, se teus beijos não me deixassem nos lábios esse gosto de ti que me alucina tanto...
Seria a saudade mais serena... Dava até pra suportar.
Mas ô, pequeno! Pra que judiar de mim, e deixar essa maldita me fazer flutuar de tanta lembrança?
Pra que tatuar esse apreço em mim, como uma insígnia de dor, que só serve pra me fazer morrer quando me recordo destes teus olhos de mel?
É de lágrima, é de sufôco o legado dessa amiúde e pungente saudade...
Mas é também de uma esperança irreprimível, de um amor digno, puro e sobretudo teimoso, que se faz permanente até no mais ignóbil silêncio.
Até nas menores sobras de presença...

Até na mais oca voz da solidão.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A Fábula da Estrela


A menina, ao encontrar com uma estrela no céu:

- Que linda és! E tens tanta pressa! Para onde vais?!
- A lugar algum, só estou partindo...
- Ora, mas nunca vi. Estrela partindo? Estrelas ficam sempre no mesmo lugar! Pois diz-me então, aonde vais, agora que estás partindo?
- A lugar algum, já te disse. Procura pôr teus pés de volta no chão, e deixa-me!
- Ah, mas sonhar é bom! Tu, que tens um lindo lar, bem que podias fazer como eu, e viver a sonhar! Olha, é mais fácil que ter de se acostumar à dores medonhas de ter os pés no chão... E é tão simples... Não acredito que possa haver coisa melhor que isto. Mas diz-me. Já que não queres dizer para onde vais, onde estavas antes de partir?
- Menina, tu és ingênua ainda. Teu lar é tão lindo quanto julgas o meu... E é bom sonhar, eu sei bem... Fiz isso por milhões de anos, e levava também as pessoas a fazerem o mesmo quando me notavam daquele pontinho azul de onde viestes, e que chamas de Terra. Mas é preciso que desças para te acostumares a sonhar apenas para alegrar a vida, porque é na realidade que de fato vais construí-la e aproveitá-la.Os sonhos são bons, mas nos levam tão alto... E é tão perigoso, meu bem...
Antes de partir eu estava no lugar onde nasci e brilhei até alguns dias atrás... É isso...

- Besteira. Realidade cansa. E como dissestes, sou nova ainda. Tenho tempo de sobra para sonhar, e não preciso correr para construir nada, e fazer forças e tudo mais que não é melhor que o doce vôo do sonho. Quanto mais alto, mais livre me sinto! Não é maravilhoso?!
Mas não entendo o que te fez sair do lugar onde moravas! Não eras feliz? Que te faltava?

- É maravilhoso, mas é perigoso quando é demais, assim como fazes. E eu era feliz, sim. Só achava tudo muito distante. Mas não me importava, pois era admirada e isso sempre me bastou. Saí porque era a hora. Cumpri minha missão que era brilhar e brilhar e brilhar.

- Ah! Pois é a vida que sempre quis! Brilhar sem me preocupar com mais nada nem ninguém, e ser admirada sempre! Acho que minha missão é como a tua! É ser estrela a minha missão!

- Tua missão é ser menina. E depois jovem. E depois uma bela mulher. Mas tens de conviver entre os teus, tal qual fiz aqui entre minhas irmãs que são estrelas também. É por isso que deves cuidar de descer e fazer florescer tua vida. E não queira saber o quão obscura pode ser a vida de uma estrela...

- Muito obscura ... Não entendo... Mas as estrelas são tão claras! Ah! Então partistes porque não queres mais ser estrela! É isso!

- Ai, não me escutas. Parti porque chegou a hora de fazê-lo.

- És confusa estrelinha, não te entendo não. E é uma pressa tanta... E me dizes tantas coisas... E olha! Teu brilho está se apagando...

- Não sou confusa querida. É que teus olhos sonhadores não te permitem ver uma gota de realidade. Já que não ouviste uma palavra do que eu te disse, contemplas agora o que acontecerá contigo se não colocares os pés no chão. Se digo que não vou a lugar algum é porque minha missão está chegando ao fim. Viste que meu brilho está se apagando, e te admirastes antes porque sabias que estrelas não partem de seus lugares. Pois bem, realmente não parti. Estou caindo. E o ruim de ser estrela é que, depois de tanto brilho, nos acabamos sempre numa dura queda. Bem do alto me espatifarei nalgum lugar que desconheço. Continua onde estás e assistirás tudo.
Mas se é este o destino que queres, então voa... E não temas o quão violenta será a tua queda.